12 de Junho de 2020
Historicamente, Wall Street demonstrou uma propensão a reagir positivamente a políticas monetárias e fiscais anticíclicas. Isto não é nenhuma surpresa. Afinal, é disso que trata a economia keynesiana dos livros didáticos, combinada com expectativas racionais: quando o setor privado gasta menos, o setor público deve pedir emprestado para gastar mais. Os mercados racionais costumam esperar que esse comportamento anticíclico estabilize a economia.
O mais surpreendente e digno de nota é que Wall Street está respondendo cada vez mais rapidamente às políticas anticíclicas, como se tivesse 100% de certeza de que a experiência passada constitui um guia certeiro para o futuro. No contexto da crise da Covid-19, o tempo de resposta dos mercados de ações dos EUA e do mundo, para o início da implementação de políticas monetárias e fiscais anticíclicas, diminuiu para zero. Como os cães de Pavlov, que salivam antes que os alimentos sejam realmente entregues à boca, os mercados parecem estar adquirindo um reflexo condicionado pelo qual meros anúncios de políticas parecem importar mais do que uma implementação eficaz, bem-sucedida e sustentável. Paradoxalmente, a credibilidade da formulação de políticas pode ter se tornado uma nova fonte de vulnerabilidade.
A recuperação dos mercados acionários desde 23 de março surpreendeu e confundiu vários investidores experientes. De fato, ela aconteceu no meio dos lançamentos de informações que indicavam a recessão mais acentuada e profunda desde a Grande Depressão. É certo que os mercados de ações têm uma propensão bem conhecida de escalar um muro de preocupações e perder o fôlego alguns meses antes da recuperação da economia real. Mas desta vez, o nível de incerteza parece extraordinariamente elevado, dada a natureza única da crise. Por exemplo, adotando a prudência como guia, os (muitos) agentes privados que entraram nesta crise com baixos saldos de caixa agora podem estar dispostos a manter saldos de caixa maiores: como sugerido por Larry Summers, o “caso precise” está substituindo o “bem a tempo”. Isso levanta a questão de saber se os multiplicadores monetários e fiscais comuns se aplicam neste momento.
Não obstante essa desvantagem em potencial, os mercados não perderam tempo para adotar um cenário em forma de V: a saber, para o S&P 500, o consenso é de que o lucro por ação (EPS) se recupere quase totalmente no segundo trimestre de 2021 e retome o crescimento “normal” dali em diante (Figura 1).
Em resumo, os mercados de ações parecem se comportar como se não houvesse risco de queda no momento atual. Sem dúvida, isso é um testemunho da credibilidade dos formuladores de políticas monetárias e fiscais que demonstraram claramente, especialmente nos EUA, sua disposição para “agir cedo e com força” em vez de "fazer pouco tarde demais". Os policymakers nos EUA, os habituais pioneiros, parecem ter se tornado tão confiáveis na mente dos mercados globais que são capazes de desencadear uma resposta condicionada global de “compra” pavloviana através de meros anúncios. Ao adotar essa postura, os policymakers têm dado uma aula de mestre na administração de expectativas.
Figura 1 – Recuperação em forma de V dos preços dos mercados de capitais dos EUA
S&P 500 EPS, projeção de consenso em USD